Joana Guerra Tadeu é consultora para projetos que têm em vista o desenvolvimento sustentável. Os seus valores e crescente interesse pelos problemas do planeta levaram-na a mudar para uma vida mais minimalista e a tornar-se ativista de causas sustentáveis. É adepta da reciclagem desde antes de existirem ecopontos e começou a compostar aos nove anos.

Qual o primeiro conselho que costuma dar às pessoas que procuram tornar os seus projetos mais amigos do ambiente?
O primeiro conselho é não medir o lucro pelas vendas. Arranjar maneira de não ser o número de vendas que defina o sucesso, mas, sim, o número de utilizações. Isto é, criar produtos como serviços, porque, se o foco continuar a ser o crescimento através das vendas, nós vamos continuar a exigir mais recursos, vamos continuar a aumentar a quantidade de recursos que estamos a pedir ao planeta para produzir e isso nunca será sustentável. Por outro lado, sugiro tentar focar o desenvolvimento e a inovação dos produtos utilizando matérias-primas que de outra forma seriam desperdiçadas por outras indústrias. Há outra linha guia, que para mim é a mais importante, mas não é a primeira que eu dou, e que tem a ver com a questão do impacto social. É preciso lembrar que não há sustentabilidade ambiental sem sustentabilidade social e económica e, portanto, não vale a pena investir num negócio que não vai conseguir cuidar das pessoas que afeta.

Uma vida minimalista é fácil ou difícil? Porquê?
Acho que é uma coisa fácil. No que toca ao minimalismo não podia ser uma coisa mais fácil, porque o que o minimalismo nos pede é que façamos menos, portanto, termos menos trabalho, menos dificuldades, menos logística, menos limpezas, menos tempo investido em coisas que não nos fazem felizes.
O que não é fácil é a mudança. Os seres humanos são muito adversos à mudança, mesmo sabendo que estão a mudar para uma coisa que os vai fazer sentir melhor. Para ajudar, nas minhas palestras, costumo falar em perceção de valor, ou seja, convido as pessoas a perceber porque é que valorizam determinadas coisas, porque assim que conseguimos fazer esse raciocínio e compreender isso, começamos a perceber que há um conjunto de coisas que valorizamos por razões com as quais não nos identificamos e quando começamos a avaliar isso de uma forma mais objetiva torna-se muito mais fácil fazer a mudança e consumir menos.

O que a levou a tornar-se uma voz ativa nesta matéria?
Não sei explicar muito bem. Foi simplesmente estar exposta e procurar informação sobre estes assuntos. A partir daí, determinados comportamentos, determinadas marcas e empresas deixaram de estar alinhadas com a minha forma de pensar e com os valores que se tornaram mais importantes para mim – os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável. Depois, foi a oportunidade e o privilégio de parar de trabalhar para estas empresas e aproveitar para criar o meu próprio negócio e fazer o meu próprio caminho. Mas, acho que o que mais contou para eu estar mais desperta para estes assuntos foi o facto de ter crescido numa família onde estes valores foram sempre incutidos. A minha mãe era ambientalista, o meu pai sempre foi politicamente ativo e é jornalista, portanto as conversas sempre foram muito sobre o estado das coisas. A minha mãe reciclava nos anos de 1980, nem havia recolha, nós tínhamos de ir aos centros entregar lixo para ser tratado e só se reciclava latas e vidro.
O momento de despertar foi aos 25 anos, altura em que tive de olhar para a minha vida e perceber o que é que estava alinhado com aquilo que eu queria e o que não estava. Comecei a trabalhar na área e depois decidi tornar-me ativista a tempo inteiro no início deste ano. Acho que esta pandemia foi o pontapé que me faltava, no sentido em que uso as competências que adquiri sempre ao serviço desta causa que é o ambientalismo.

O verde fica-lhe bem, sustentavelmente falando?
Sim… É engraçado porque à medida que comecei a alinhar-me mais com estes valores, por exemplo em termos de estilo, de repente passei a ter um look mais “natura”, porque deixei de comprar em modo fast fashion e estar vestida como toda a gente, por isso, sem dúvida que sim. Por outro lado, como consumo de uma maneira muito alinhada com os meus valores, sinto-me muito bem com as compras que faço. Há toda uma moda e uma tendência de consumo, nas redes sociais e na publicidade, à volta da sustentabilidade, porque é um assunto que os consumidores trouxeram para a ordem do dia, o que quer dizer que aqueles meus comportamentos que há cinco anos eram esquisitos agora são uma tendência e são aplaudidos. Mas, mais do que isto, o verde é uma cor que me fica bem porque está de acordo com os meus valores e isso faz-me sentir bem.

A reciclagem é importante? Porquê?
Claro que sim. Nas minhas palestras, costumo dizer que ser ecológico e ambientalista não é reciclar mais, é reciclar menos. Não porque não é importante, mas porque produzimos menos lixo, consumimos menos embalagens e menos descartáveis e, por isso, temos menos material para reciclar. Mas a reciclagem é o único futuro que o lixo pode ter. O lixo tem de ser o fim do lixo, ou seja, não pode haver lixo, ele tem de ser reciclado, é uma matéria-prima, é valor, portanto, claro que sim, a reciclagem é importantíssima e toda a gente tem de reciclar. Quando se faz lixo, isso tem de ser transformado em alguma coisa, tem de ser valorizado, seja através da compostagem, da reutilização ou da reciclagem.

Há algum objeto ou produto que esteja a utilizar que seja proveniente de material reciclado?
Sim, várias coisas. A camisola de lã que tenho vestida é feita de um fio que foi reciclado a partir de peças que foram desaproveitadas por outro designer. A capa do meu telemóvel é reciclada de plástico recolhido dos oceanos. A minha filha tem meias que também são feitas de plástico recolhidos dos oceanos, entre várias outras coisas.