O surfista português Miguel Blanco, bicampeão nacional, entre 2018 e 2019, faz da modalidade mais do que um desporto. É que o surf é uma forma de vida que se alinha com os ideais de preservação da natureza. Antes de se tornar embaixador da campanha Eat for Change, da associação World Wide Fund For Nature, já se intitulava embaixador do mar e apelava à sua preservação.

Diz que ser surfista é mais do que ser desportista, é uma forma de viver. Como é este estilo de vida e de que forma é ou pode ser sustentável?
Acho que a nossa relação com o mar e com a natureza faz com que nos deparemos com alguns desafios e como, de certa forma, dependemos do mar, pois passamos muitas horas na água, isso faz-nos querer ser mais sustentáveis, ter cuidado com a natureza. O surf é um desporto que está a caminhar para ser cada vez mais sustentável. Já há pranchas com blocos de esferovite que são reutilizáveis e já há resinas ecológicas; portanto, sem dúvida que estamos a tornar a modalidade mais sustentável.

O que o levou a associar-se ao World Wide Fund For Nature (WWF)?
Antes ainda de me associar ao WWF eu já fazia algumas limpezas de praias e outras ações associadas à preservação dos oceanos e da natureza e acabou por aparecer esta oportunidade de ser embaixador desta campanha, “Eat for Change”, que transmite às pessoas que é bom ter uma dieta mais sustentável, não só pela sua saúde, mas também para se saber o que se está a consumir. Penso que o mais importante a trabalhar em Portugal é a consciência do que estamos a comer e saber de onde vêm os produtos, se estes são orgânicos ou não, mesmo sendo carne e peixe saber de onde vieram e como foram criados os animais, apesar de defender mais uma dieta vegetariana.

Como embaixador do WWF no programa “Eat for Change”, qual é a mensagem que pretende transmitir?
No meu ver, uma dieta saudável é uma dieta sustentável. Comer com sustentabilidade é saber o que comemos, é tentar ter uma dieta maioritariamente vegetariana e comer carne e peixe menos vezes. E se tivermos essa consciência, de que estamos a comer de forma mais sustentável, ajuda a direcionar o foco para alimentos saudáveis. Preserva-se o corpo e também a natureza e, quando se tem consciência de que estamos a fazer bem a ambas as coisas, é super fácil adotar uma dieta mais saudável e sustentável.

crédito de imagem António Saraiva

A reciclagem faz parte da rotina? É tão fácil como apanhar uma onda ou nem por isso?
Claro que a reciclagem faz parte da rotina, desde sempre. Felizmente, é uma coisa que já se aprende na escola. Eu também tento influenciar as pessoas a reciclar. Mas, mais que reciclar é também preciso tentar dar uma nova vida às coisas. Tentar escolher um estilo de vida em que se evitam coisas embaladas, diminuir a quantidade de lixo e a pegada que deixamos no planeta.

Já há pranchas feitas de materiais sustentáveis. A sua é assim ou ainda é convencional?
Algumas das minhas pranchas já têm uma parte a que se pode chamar sustentável. Também estamos a fazer várias experiências nesse sentido com blocos 100% reutilizáveis, mas isso ainda é um processo em desenvolvimento e para uma prancha de alta performance, para competir, o método convencional ainda está um pouco mais à frente. Mas, como é obvio, estou cada vez mais a apostar nos materiais sustentáveis e a aproximar-me de uma prancha ecológica.

Também numa onda de sustentabilidade, o Miguel tem o hábito de recolher lixo nas praias. O que o motivou?
Aquilo que me motiva é o impacto que uma pessoa tem na sociedade e no local. É obvio que não vai ser o lixo que eu apanho num sítio que vai salvar o mundo ou que vai mudar o planeta, mas vai influenciar muita gente. Porque há muita gente que vai ver e vai ganhar consciência de que olhamos para a praia e ela parece limpa, mas, na verdade, se olharmos com atenção não está limpa, até se pode considerar bastante suja. Fazer estas limpezas acaba por ser, de alguma maneira, uma forma de deixar algo positivo nos sítios onde vou. Uma simples limpeza de praia é algo que marca muita gente.

Qual foi a limpeza de praia que mais o marcou e porquê?
A limpeza que mais me marcou foi a das Maldivas. Numa ilhazinha para onde toda a gente olhava e ninguém fazia nada. Eu juntei mais duas pessoas e fomos limpar. Acabámos por tirar umas fotografias e realmente teve bastante impacto. Funcionou como uma chamada de atenção, porque as Maldivas são o maior paraíso de sempre, mas, se formos ver de perto, há muito para melhorar.

O que fazem com o lixo que apanham?
A maior parte das vezes, fazemos a separação e colocamos para reciclagem, já aconteceu também oferecermos a artistas amigos que fazem exposições com resíduos do oceano.

crédito de imagem: Maldives Surf Photography

O Miguel considera que os surfistas são (ou devem ser) embaixadores naturais dos oceanos. Que responsabilidades particulares têm?
Claro que são, nós passamos muito tempo na praia, no mar, andamos muito à procura das ondas, o que nos leva a esse confronto direto com vários desafios e várias questões ambientais, não só do lixo plástico, como do aquecimento global. Nós sentimos isso tudo, mesmo a alteração do clima faz diferença e tem impacto no oceano. Portanto, acho que devemos fazer a nossa parte.

De que forma podemos/devemos todos contribuir para melhor cuidar do planeta?
Acho que o melhor que podemos e devemos fazer para contribuir para cuidar de um melhor planeta é termos consciência do que estamos a fazer. É pensar em três aspetos: alimentação, deslocação e vestuário. Penso que se atacarmos estes três pontos já estamos a contribuir para um mundo bastante melhor. Depois, claro, a relação com as energias em casa e a separação dos resíduos, isso também tem uma grande influência.