Joana Campos Silva é especialista em estratégia e desenvolvimento de marcas de moda e tem vindo a aprofundar os seus conhecimentos em design circular. Na sua perspetiva, a sustentabilidade da área é uma urgência e também um parâmetro inevitável a longo prazo.  As suas preocupações sustentáveis vão além do trabalho, procurando incluir nas suas rotinas diárias ações mais amigas do planeta.

A Joana adora fazer moda. Considera que esta área se pode tornar mais sustentável? De que forma?
É óbvio que o setor da moda, tal como qualquer setor, tem de se tornar mais sustentável. Não acho que seja uma hipótese ou uma alternativa, é uma obrigatoriedade de qualquer setor. Principalmente porque esta é uma das áreas mais poluentes do mundo e é obvio que, sendo a moda uma das maiores inovações do mundo, tem de se reinventar e tem de trazer esta abordagem mais sustentável. Na minha perspetiva e considerando um dos estudos que fiz recentemente “cradle to cradle”, não só vamos ter de reciclar as matérias-primas já existentes no mercado, mas, mais do que tudo, temos de reinventar e transformar o mercado da moda para que ele se torne autossustentável, ou seja, que tenha métodos que permitam a desmontagem e a reutilização das peças, que permitam trabalhar com ciclos biológicos em que a roupa se autodestrói e regenera em novos ciclos.

Consumidores e “makers” estão a tornar-se mais conscientes em relação ao planeta. Isto acontece por moda ou por preocupação?
A sustentabilidade é uma temática que está a ser falada desde os anos 1960, mas, infelizmente, a transformação de comportamentos leva muito tempo e a verdade é que nós, mesmo tendo atitudes diferentes, como não sentimos impacto imediato na nossa vida, temos muito mais dificuldade em adquirir novos mecanismos de consumo. Com isto eu quero dizer que, na minha perspetiva, a sustentabilidade não é uma tendência, não é uma moda, o que é moda é a nossa consciência, ou seja, nós estamos muito mais conscientes desta temática, apesar de ser algo que já está a ser falado há muitos anos. É algo que temos de ter em consideração e é uma inevitabilidade, logo não podemos considerar isto como uma tendência, mas, sim, como uma urgência.

Quais são os primeiros conselhos que dá a quem quer iniciar um projeto neste ramo?
Efetivamente, muitas marcas querem começar a sua atividade e querem ter um posicionamento sustentável. A primeira coisa que eu aconselho sempre é “não se posicionem como uma marca sustentável”, porque todas as marcas vão ter de o ser. Hoje, isso pode ser considerado um parâmetro, mas, a longo prazo, será algo completamente banal. É o mesmo que falar em sustentabilidade financeira, se tivermos um negócio e não tivermos um plano, nem um objetivo financeiro, não é um negócio. Por isso, tal como acontece com qualquer outra área fundamental ao desenvolvimento de uma marca, o parâmetro da sustentabilidade é um parâmetro básico, intrínseco àquilo que é o desenvolvimento do negócio.

Quando alguma marca se inicia, o que eu aconselho primeiro é estudar, porque muitas vezes, até por desinformação, ou por não terem estudado o suficiente, acabam por ir buscar grandes clichés e pensar que têm uma marca sustentável porque estão a usar “dead stock” ou porque estão a usar um packaging reciclado, ou algodão orgânico. Isso não é ter uma marca sustentável. Para se ter uma marca sustentável, tem de se trabalhar vários parâmetros, um deles está relacionado com as pessoas que estão envolvidas no processo, o impacto real que tem. Está muita gente preocupada em trabalhar a eficiência e não a efetividade, ou seja, muitas marcas estão a tomar decisões, porque acham que estão a ser mais eficientes e estão a criar menos problemas ao planeta, mas, depois, não quer dizer que, na verdade, tenham uma marca com menor impacto.

Por exemplo: uma marca que vende produtos tendência e que quer usar algodão orgânico, mas depois, se for preciso, faz a impressão ou um tingimento fluorescente, isso não é sustentável. Se o fluorescente é uma cor do momento e só vai ser usada naquele período de tempo, está-se a trabalhar para o fim de um produto. O que o mercado sustentável procura é trabalhar para um produto de longevidade. Uma decisão tão simples como a atribuição de uma cor pode minar completamente a ideia e o conceito de sustentabilidade. Acho que este é um problema comum e transversal à maior parte das marcas.

Além da moda, quais são os seus hábitos sustentáveis no quotidiano?
No dia a dia há, várias coisas que vou fazendo. Uma delas é o recusar, adquirir menos produtos. Outra é tentar comparar melhor, produtos que a longo prazo façam mais sentido e que durem mais tempo. E faço também a reciclagem. É fundamental, temos de evitar o aterro o máximo possível e a reciclagem é um dos atos mais básicos neste processo. Faço a separação das embalagens há três ou quatro anos, porque, até aí, não tinha percebido que, se não fôssemos nós a fazer, ela não era feita. A reciclagem é superimportante e é algo tão básico que todos devíamos fazer. Aliás, uso várias coisas com material reciclado, desde produtos para casa, artigos de decoração, moda…